segunda-feira, 23 de janeiro de 2017

FEBRE AMARELA


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SINOPSE
FEBRE AMARELA

Guia de Vigilância em Saúde – Ministério da Saúde

CID-X: A95

EPIDEMIOLOGIA
               CICLO SILVESTRE: O ciclo silvestre é endêmico nas regiões tropicais da África e das Américas. Geralmente se apresenta sob a forma de surtos com intervalos de tempo que variam de 3 a 7 anos, alternados por períodos com menor número de casos. Em geral, na população humana, o aparecimento de casos tem sido precedido de epizootias de primatas não humanos (PNH).

Figura1: Áreas com e sem recomendação de vacina contra febre amarela no Brasil, 2012. Área com recomendação da vacina (ACRV): áreas anteriormente consideradas endêmicas e de transição, com a inclusão do sul de Minas Gerais, até então considerada “área indene de risco potencial”. Área sem recomendação de vacina (ASRV): áreas indenes, incluindo também o sul da Bahia e o norte do Espírito Santo, que antes eram consideradas “áreas indenes de risco potencial”.

AGENTE ETIOLÓGICO
               A febre amarela é causada por uma arbovírus do gênero Flavivirus, da família Flaviviridae1.

HOSPEDEIROS E RESERVATÓRIOS
HOSPEDEIROS:
  • CICLO SILVESTRE: primatas não-humanos. Homem é hospedeiro acidental.
  • CICLO URBANO: homem.

RESERVATÓRIOS
               Mosquitos são os reservatórios do vírus da febre amarela. Uma vez infectados, permanecem assim por toda a vida. Apenas a fêmea transmite o vírus, pois o repasto sanguíneo tem como intuito prover nutrientes essenciais para a maturação dos ovos e completude do ciclo gonotrófico.  A transmissão também ocorre de forma vertical, onde as fêmeas dos mosquitos transferem os vírus para suas proles.

MODO DE TRANSMISSÃO
               O vírus é transmitido pela picada dos mosquitos transmissores infectados. Não há transmissão de pessoa a pessoa.
               CICLO URBANO: a transmissão ocorre a partir de vetores urbanos (Aedes aegypti) infectados.
CICLO SILVESTRE: os transmissores são mosquitos com hábitos estritamente silvestres (gêneros Haemagogus e Sabethes, na América Latina). No Brasil, os principais vetores são das espécies Haemagogus janthinomys (mais frequentemente) e Haemagogus leucocelaenus. Participam de forma secundária na transmissão as espécies: Haemagogus albomaculatus, Sabethes glaucodaemon, Sabethes chloropterus, Sabethes cynaeus e Sabethes soperi.

Figura2: Ciclos epidemiológicos (silvestre e urbano) da febre amarela no Brasil.

PERÍODO DE INCUBAÇÃO
               O período de incubação da febre amarela varia de 3 a 6 dias, podendo se estender até 15 dias.

PERÍODO DE TRANSMISSIBILIDADE
               O período de transmissibilidade compreende dois ciclos: intrínseco (que ocorre no homem) e extrínseco (que ocorre no vetor).
               CICLO INTRÍNSECO: a viremia humana dura, no máximo, 7 dias, e vai de 24-48 horas antes do aparecimento dos sintomas até 3 a 5 dias após o início da doença, período em que o homem pode infectar os mosquitos transmissores.
               CICLO EXTRÍNSECO: No mosquito, após um repasto com sangue infectado, o vírus migra para as glândulas salivares, onde se multiplica depois de 8 a 12 dias de incubação. A partir desse momento, a fêmea do mosquito passa a ser capaz de transmitir o vírus amarílico até o final de sua vida (6 a 8 semanas).

SUSCETIBILIDADE E IMUNIDADE
               SUSCETIBILIDADE: universal.
               IMUNIDADE: a infecção confere imunidade duradoura. Os filhoS de mães imunes podem apresentar imunidade passiva e transitória durante os primeiros 6 meses de vida.

QUADRO CLÍNICO
               Tipicamente, a febre amarela caracteriza-se por manifestações de insuficiência hepática e renal, tendo geralmente apresentação bifásica, com um período inicial prodrômico (infecção) e um toxêmico (que surge após uma aparente remissão e, em muitos casos, evolui para óbito em aproximadamente uma semana).
               PERÍODO DE INFECÇÃO: dura cerca de 3 dias, tendo início súbito de sintomas inespecíficos como febre, calafrios, cefaleia, lombalgia, mialgias generalizadas, prostração, náuseas e vômitos.
               REMISSÃO: ocorre declínio da temperatura e diminuição dos sintomas, provocando uma sensação de melhora no paciente. Dura poucas horas e, no máximo, um a dois dias.
               PERÍODO TOXÊMICO: reaparece a febre, diarreia e vômitos com aspecto de borra de café. Instala-se quadro de insuficiência hepatorrenal caracterizado por icterícia, oligúria, anúria e albuminúria, acompanhado de manifestações hemorrágicas (gengivorragia, epistaxe, otorragia, hematêmese, melena, hematúria, sangramentos em locais de punção venosa), prostração intensa e comprometimento do sensório, com obnubilação mental e torpor, com evolução para coma e morte. O pulso torna-se mais lento apesar da temperatura elevada (sinal de Faget – dissociação pulso-temperatura).

DIAGNÓSTICO
DIAGNÓSTICO LABORATORIAL
EXAMES ESPECÍFICOS
  • SOROLOGIA PELO MÉTODO DE CAPTURA DE ANTICORPOS IgM (MAC-ELISA): Método de escolha. Deve ser analisado conjuntamente com os dados clínicos e epidemiológicos, considerando reações cruzadas e inespecíficas;
  • SOROLOGIA PELO TESTE DE INIBIÇÃO DA HEMAGLUTINAÇÃO EM AMOSTRAS PAREADAS: análise de amostras coletadas com intervalo de 15 dias da primeira para a segunda amostra. Depende dos dados clínicos e epidemiológicos para conclusão diagnostica.
  • SOROLOGIA IgG-ELISA: depende dos dados clínicos e epidemiológicos para conclusão diagnostica.
  • PESQUISA VIRAL EM CULTURA CELULAR: empregado na fase inicial da doença, para isolamento viral ou detecção do genoma viral pela técnica de reação em cadeia da polimerase de transcrição reversa (RT-PCR), em amostras de sangue ou tecido, conservados em temperaturas ultrabaixas.
  • IMUNO-HISTOQUÍMICA: detecção de antígeno viral pode ser realizado em amostras de tecidos (principalmente o fígado) conservadas em temperatura ambiente, em formalina tamponada a 10%.
  • EXAME HISTOPATOLÓGICO DO FÍGADO: necrose médio-lobular ou médio-zonal e a presença dos corpúsculos acidófilos de Coulcilman.

EXAMES INESPECÍFICOS
  • PROVAS DE FUNÇÃO HEPATICA:
    • BILIRRUBINA TOTAL:
      • Normal (adulto): 0,3-1,2 mg/100mL sangue;
      • Encontra-se elevada na lesão intensa dos hepatócitos, caracterizando-se pela presença de icterícia nas mucosas e/ou pele.
    • BILIRRUBINA DIRETA:
      • Normal (adulto): 0,1-0,3 mg/100mL sangue;
      • Encontra-se elevada na lesão intensa dos hepatócitos, caracterizando-se pela presença de icterícia nas mucosas e/ou pele.
    • AMINOTRANSFERASES:
      • ASPARTATO AMINOTRANSFERASE (AST) ou TRANSAMINASE GLUTÂMICA OXALACÉTICA (TGO):
        • Normal (adulto): < 40 U/L;
        • Valores > 1000 U/L indicam doença associada com lesão extensa do tecido hepático, como ocorre nos casos graves de febre amarela.
      • ALANINA AMINOTRANSFERASE (ALT) ou TRANSAMINASE GLUTÂMICA PIRÚVICA (TGP):
        • Normal (adulto): < 30 U/L;
        • Valores > 1000 U/L indicam doença associada com lesão extensa do tecido hepático, como ocorre nos casos graves de febre amarela.
  • PROVAS DE FUNÇAO RENAL:
    • URÉIA:
      • Normal (adulto): 10-45 mg/dL.
    • CREATININA:
      • Normal (adulto): 0,6-1,3 mg/dL.
      • Valores superiores a 1,5 mg/dL podem indicar complicações e/ou doença renal.

TRATAMENTO
               O tratamento é sintomático, com cuidadosa assistência ao paciente que, sob hospitalização, deve permanecer em repouso, com reposição de líquidos e das perdas sanguíneas, quando indicado. Nas formas graves, o paciente deve ser atendido em Unidade de Terapia Intensiva (UTI).

NOTIFICAÇÃO
               A febre amarela é de notificação compulsória. A notificação deve ser registrada por meio do preenchimento da Ficha de Investigação da Febre Amarela do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN).

MEDIDAS DE PREVENÇÃO E CONTROLE
IMUNIZAÇÃO
               A vacina contra a febre amarela (VFA) é a medida mais importante e eficaz para prevenção e controle da doença. É constituída por vírus atenuados da cepa 17DD, derivada de uma amostra africana do vírus amarílico. Apresenta eficácia acima de 95%.
               Posologia da vacina VFA: 0,5 mL, via subcutânea.
               Indicações da vacina:
  • Residentes ou viajantes para as áreas com recomendação da vacina (todos os estados das regiões Norte e Centro Oeste, Minas Gerais e Maranhão, alguns municípios dos estados do Piauí, Bahia, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul) devem ser vacinados pelo menos 10 dias antes da viagem, no caso de pessoas que nunca foram vacinadas ou sem comprovante de vacinação. Em caso de revacinação, esse prazo não se aplica.
  • Pessoas que se deslocam para países em situação epidemiológica de risco, conforme as recomendações do Regulamento Sanitário Internacional (RSI). A vacinação é indicada para toda a população a partir dos 9 anos de idade, com a administração de dose de reforço aos 4 anos de idade.
  • Algumas particularidades devem ser destacadas:
    • Em pessoas a partir de 5 anos de idade, que receberam uma dose da vacina antes de completar 5 anos de idade, administrar uma única dose de reforço, com intervalo mínimo de 30 dias entre as doses.
    • Pessoas a partir de 5 anos de idade que nunca foram vacinadas ou sem comprovante de vacinação: administrar a primeira dose da vacina e 1 dose de reforço, 10 anos após a administração dessa dose.
    • Pessoas a partir dos 5 anos de idade que receberam 2 doses da vacina: considerar vacinado e não administrar nenhuma dose.
    • Pessoas com 60 anos ou mais, que nunca foram vacinados ou sem comprovante de vacinação, o médico deverá avaliar o beneficio/risco da vacinação, levando em conta o risco da doença e o risco de eventos adversos nessa faixa etária e/ou decorrentes de comorbidades.
    • Para gestantes, independentemente do estado vacinal, a vacinação está contraindicada. Na impossibilidade de adiar a vacinação, como em situações de emergência epidemiológica, vigência de surtos, epidemias ou viagem para área de risco de contrair a doença, o médico deverá avaliar o beneficio/risco da vacinação.
    • Para as mulheres que estejam amamentando crianças com até 6 meses de idade, independentemente do estado vacinal, a vacinação não está indicada, devendo ser adiada até a criança completar 6 meses de vida. Na impossibilidade de adiar a vacinação (situações de emergência epidemiológica, vigência de surtos, epidemias ou viagem para área de risco de contrair a doença), o médico deverá avaliar o benefício/risco da vacinação. Em caso de mulheres que estejam amamentando e que receberam a vacina, o aleitamento materno deve ser suspenso, preferencialmente, por 28 dias após a vacinação (com um mínimo de 15 dias).
    • Em pacientes com imunodeficiência, a administração da vacina deve ser condicionada à avaliação médica individual de benefício/risco e não deve ser realizada em caso de imunodepressão grave.
    • Em crianças com menos de 2 anos de idade nunca vacinadas com VFA, não administrar essa vacina simultaneamente com a vacina tríplice viral ou tetra viral. O intervalo mínimo entre as vacinas é de 30 dias, salvo em situações especiais que impossibilitem manter o intervalo indicado. Se a criança recebeu anteriormente as vacinas tríplice viral e febre amarela, não deve haver interferência na imunogenicidade entre elas, as duas poderão ser administradas simultaneamente ou sem intervalo mínimo entre as doses. Se a criança recebeu apenas uma das vacinas (tríplice viral ou febre amarela), estabelecer preferivelmente o intervalo mínimo de 30 dias entre as doses.
    • Em situações de suspeita de surto, epizootia ou confirmação da circulação viral em vetores silvestres, a dose inicial deve ser antecipada para 6 meses de idade e essa dose não será considerada válida para fins de cobertura de rotina. Revacinar aos 9 meses e aos 4 anos de idade.
    • Nos casos de doenças agudas febris moderadas ou graves, recomenda-se adiar a vacinação até a resolução do quadro, com o intuito de não se atribuir à vacina as manifestações da doença em curso.
    • Pacientes que tenham desencadeado doença neurológica de natureza desmielinizante (Síndrome de Guillain-Barré, encefalomielite disseminada aguda e esclerose múltipla) no período de 6 semanas após a aplicação de dose anterior de VFA, deve receber a vacina após avaliação médica.
    • Paciente transplantados de células-tronco hematopoiéticas (medula óssea) devem ser avaliados caso a caso, considerando o risco epidemiológico. Caso se decida pela vacinação, deve ser respeitado o prazo mínimo de 24 meses após o transplante.
  • IMUNIDADE: os anticorpos protetores aparecem entre o 7° e o 10° dia após a vacinação. O paciente deve receber a vacina 10 dias antes de ingressar na área de transmissão.
  • CONTRA-INDICAÇÕES:
    • Crianças menores de 6 meses de idade;
    • Indivíduos com história de reação anafilática relacionada a substâncias presentes na vacina (gelatina bovina, ovo de galinha e seus derivados, por exemplo);
    • Pacientes com alguma das condições abaixo:
      • Infectados pelo HIV com imunossupressão grave, com a contagem de células CD4 < 200 células/mm3 ou menos de 15% do total de linfócitos para crianças menores de 6 anos.
      • Em tratamento com drogas imunossupressoras (corticosteroides, quimioterapia, radioterapia e imunomoduladores);
      • Submetidos a transplante de órgãos;
      • Imunodeficiência primária;
      • Imunodepressão de qualquer natureza;
      • Neoplasia;
      • História pregressa de doenças do timo (miastenia gravis, timoma, casos de ausência de timo ou remoção cirúrgica).
    • EVENTOS ADVERSOS:
      • Dor local, mal-estar, cefaleia, dores musculares e febre baixa, que ocorrem por volta do 5° ao 10° dia pós-vacinal e duram de 1 a 2 dias.
      • Reações de hipersensibilidade imediata (erupção, urticária, angioedema e choque anafilático) podem ocorrer de 30 minutos até 2 horas após a administração da vacina.
      • Doença neurológica aguda associada à VFA (DNA-VFA): encefalite (mais frequente em menores de 6 meses), meningite, doenças autoimunes com envolvimento do sistema nervoso central e periférico.
      • Doença viscerotrópica aguda associada à VFA (DVA-FVA): evento adverso de maior letalidade decorrente da disseminação do vírus vacinal para diversos órgãos, com choque, derrame pleural, ascite e falência de múltiplos órgãos.

CONTROLE VETORIAL
  • Evitar o acesso dos mosquitos transmissores ao doente mediante utilização de tela no seu local de permanência.
  • Adotar ações emergenciais de eliminação do A. aegypti, principalmente nos locais em que os casos estão internados.
  • Fortalecer as ações de combate vetorial nos municípios situados próximos às áreas de transmissão.

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
 
 
Site de Legislação em Saúde no Brasil